Nos importando com os “gaps” nos esportes das mulheres

HÁ UM “GAP” DE DADOS (TAMBÉM) NO ESPORTE DAS MULHERES

JOGA Brazil
7 min readApr 29, 2021

Cerca de três meses atrás, eu estava lendo este artigo chamado “Relação entre Maturação Biológica, Aptidão Física e Variáveis ​​Cine antropométricas de Jovens Atletas: Uma Revisão Sistemática e Meta-Análise”. Portanto, embora eu estivesse procurando mais informações sobre jovens atletas de acordo com seu sexo, não estava realmente procurando por problemas de disparidade de gênero. E então a seguinte frase surgiu no texto:

“Ao longo da análise, foram observadas algumas limitações na literatura atual. A mais marcante foi a escassez de estudos realizados com populações femininas”.

Bem, sim. É por isso que eu estava lendo aquele artigo em primeiro lugar! Procuro esses estudos realizados com as populações femininas.

Em parte, é também por isso que continuo tendo esses debates saudáveis ​​com Tabata, uma educadora física e especialista em Fisiologia do Exercício. Quanto a mim, alguém que entende um pouco mais sobre como a cultura e os aspectos sociais formam os indivíduos, não me sinto muito confortável com o argumento das diferenças biológicas justificando completamente porque homens e mulheres são TÃO diferentes. E minha curiosidade se baseia na hipótese de que TALVEZ se tratássemos meninos e meninas de maneira mais igual, TALVEZ seus corpos não apresentassem tantas diferenças de desempenho mais tarde.

Quer dizer, sabemos que existem fases sensíveis para o desenvolvimento motor. E sabemos que a maioria das culturas atuais associa as atividades físicas como uma “coisa de menino” e não como uma “coisa de menina”. Também sabemos que as meninas atingem a puberdade mais cedo (mas por quê, realmente, eu me pergunto) do que os meninos e, durante essa fase, as meninas mostram algumas vantagens bem claras.

Mas, de acordo com a Women’s Sports Foundation, na América, os meninos tiveram 1,13 milhão de oportunidades de esporte a mais do que as meninas e 40% das meninas adolescentes não participaram ativamente do esporte, entre 2018 e 2019. Por fim, também sabemos que as meninas costumam entrar nos esportes mais velhas do que os meninos; elas desistem mais cedo e em maior número também.

Onde está exatamente a linha aqui e o que há com a obsessão de todos com o argumento da testosterona? (Tabata vai me matar por publicar esta parte). Por que é a referência mais popular para explicar o desempenho? Quão relevantes são as outras variáveis?

Não sei dizer se tenho ouvido demais os argumentos da Simone de Beauvoir, mas tenho quase certeza de que há muito o que desvelar aqui, especialmente olhando para esse problema com as lentes das oportunidades. Quer dizer, quem teve a chance e o estímulo para ser devidamente treinado ou mesmo o incentivo para ser uma criança ativa nesses anos de formação, e considerando os estereótipos de gênero em nossa sociedade?

Estou compartilhando essas questões para nos mantermos progredindo em nosso conhecimento comum, mas, por enquanto, faremos argumentos muito mais simples. Vamos terminar esta parte ressaltando que existe uma lacuna de dados — também no esporte feminino.

O “GAP” DE DADOS NOS ESPORTES DAS MULHERES

Entendemos que o ambiente escolar é um grande influenciador no setor esportivo. Portanto, seria muito importante fazer esses acompanhamentos sobre Desenvolvimento de Habilidades Motoras se quisermos ter certeza de que o sistema educacional está sendo eficaz e justo — para meninos E meninas. É uma questão de saúde pública e é uma questão educacional. Com isso apontado para o início da conversa, quando se trata daquelas meninas que depois dos anos escolares se tornaram mulheres participando de esportes, a lacuna de dados continua.

A lacuna de dados afeta o campo científico — o que significa que há um problema com a falta de estudos sendo realizados com meninas e mulheres — bem como a indústria do esporte. É muito difícil encontrar dados consistentes sobre o esporte feminino, seja no presente, seja no passado. Portanto, a história do esporte feminino precisa constantemente de esforços extras para ser organizada e contada em diferentes culturas. Fato que dá a falsa impressão de que não se sabe muito sobre as mulheres nos esportes porque ou as mulheres nos esportes não existem ou são uma espécie de exceção à regra dos homens.

E eu me pergunto qual é o efeito disso sobre a imaginação dos players desta indústria. No Brasil, alguns profissionais nem conseguem conceber a ideia de trabalhar com meninas E futebol, mesmo que sejam muito especializados em suas áreas técnicas, como, por exemplo, educadores físicos ou treinadores de futebol. Portanto, eles têm suas escolas, seus clubes, suas atividades, e não abrem oportunidades para as meninas em meados de 2021.

Encontrei uma mulher falando no youtube sobre esse assunto na palestra “Caroline Criado Perez: Por dentro da lacuna de gênero nos dados”. Mais tarde, descobri que ela também escrevia um best-seller chamado “Mulheres Invisíveis — Expondo o viés de dados em um mundo projetado para homens”. De qualquer forma, ela diz que, ao longo de sua ampla pesquisa, descobriu que a Ciência do Esporte é realmente ruim por não incluir as mulheres — pior ainda do que a área médica.

Uma coisa é nos perguntarmos se os dados estão sendo produzidos de forma consistente sobre meninas e mulheres em tópicos relacionados a esportes ou não — a lacuna de dados. Outra coisa é nos perguntarmos se a informação disponível tem sido demonstrada— a lacuna de visibilidade. E uma terceira coisa seria avaliar se a informação que vem sendo produzida e mostrada está sendo apresentada de forma adequada — os aspectos qualitativos.

FECHANDO A FALHA DE VISIBILIDADE NO ESPORTE DAS MULHERES

Para dar um exemplo da lacuna de visibilidade no Esporte das Mulheres, a campanha portuguesa de 2021 #WomenAlsoPlay (#ElasTambémJogam) organizada pelas Raparigas da Bola procurou argumentar visualmente que os meios de comunicação social não dão muito espaço às mulheres que praticam esporte.

Também na Europa, o Women’s Sport Trust, fundado pela Sport England, fez parceria com a Two Circles para pesquisar as atitudes e o comportamento dos fãs de esportes e especialistas da indústria em relação à visibilidade do esporte feminino. Elaboraram um relatório chamado “Fechando a lacuna de visibilidade”.

“Projetado para as partes interessadas da indústria esportiva, este relatório e os kits de ferramentas fornecem percepções do estudo mais compreensivo e abrangente do esporte das mulheres no Reino Unido, bem como ações claras que todos podemos tomar para ajudar o esporte das mulheres a ter sucesso. Estamos ansiosos para ver como nossa indústria enfrenta o desafio.”

- Tammy Parlor MBE, CEO e cofundadora da Women’s Sport Trust.

Há muitas informações neste relatório, mas mesmo a mídia ligada ao ambiente institucional formal em torno do futebol feminino — como a Federação Inglesa de Futebol (The FA) — não está fazendo a sua parte para garantir uma representação igual em suas publicações. De acordo com o relatório, quando se trata da proporção de imagens de atletas de elite, enquanto os homens alcançaram quase 50%, as mulheres obtiveram menos de 15% desse “espaço” — considerando a análise de imagens de setembro de 2019 a setembro de 2020, inclusive.

Mas a grande notícia otimista é que a recentemente publicada pesquisa da RunRepeat, com 5.000 fãs de futebol, mostrou que as pessoas querem ver mais dos esportes das mulheres e há um apetite por acesso regular ao futebol feminino profissional:

“Considerando os números da pesquisa, o futebol feminino da liga deve testemunhar um aumento de 296,70% no Reino Unido se estiver na TV. Na UE, o aumento pode chegar a 358,70%, e nos EUA, 304,6%.”

- Vyom Chaudhary, RunRepeat

O PRO CAMINHO DENTRO E EM TORNO DA CENA DE FUTEBOL

E por último — mas não menos importante — devemos voltar às lentes das oportunidades e da percepção da indústria do esporte e do próprio futebol do esporte como os setores econômicos que têm trabalhadores, e esses trabalhadores também têm gênero entre outras características sociais como raça, classe , nacionalidade, etc.

Então, essa parte foi meio que provocada pela Neide Oliveira, que nos perguntou se temos algum estudo sobre o tema pós-carreira. Com certeza mencionamos a carreira de jogadoras de futebol em nossas publicações nas redes sociais, mas ainda não fizemos nenhuma pesquisa científica sobre isso.

Mas, como ela perguntou, e já que pensamos nas mulheres do setor como trabalhadoras, os caminhos profissionais importam — muito. Então, pesquisei e encontrei esta Dissertação de Mestrado intitulada “Futebol como Trabalho: As Novas Realidades das Mulheres Futebolistas Profissionais na Inglaterra” que propõe as seguintes questões:

Como as mulheres (jogadoras de futebol profissionais) ‘desempenham’ seu papel no trabalho e por que seus papéis no trabalho são generificados dessa forma?

Que políticas de emprego e de local de trabalho existem para apoiar as jogadoras de futebol em suas novas carreiras?

Quais são as implicações da profissionalização na vida das jogadoras profissionais de futebol?

Bem, eu não estarei respondendo isso por agora. Gostaria apenas de compartilhar com vocês algumas das questões que temos em mente sobre os gaps nos esportes das mulheres.

Créditos: Natália Lopes

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